domingo, janeiro 15, 2006

Opinião: a uma semana das eleições...

Estamos precisamente a uma semana das eleições presidenciais.
Segundo as últimas sondagens realizadas pela Marktest para a TSF e o DN, Cavaco Silva seria vencedor à primeira volta com 56,6% dos votos. Manuel Alegre seria segundo com 16%, seguido de Mário Soares com 11,7%. Francisco Louça com 9,3%, surgiria à frente de Jerónimo de Sousa que não ultrapassaria os 6%. Garcia Pereira não ultrapassaria os 0,4%.
Isto significa que, pela primeira vez na nossa história, vamos ter um Presidente da República de direita: Aníbal Cavaco Silva. E quem é Cavaco Silva?

Cavaco Silva é um economista com 66 anos, que já foi primeiro-ministro durante 10 anos (1985-1995) e, curiosamente, candidato a Presidente da República em 1996, então derrotado por Jorge Sampaio.
Embora tenha feito um bom trabalho nos primeiros mandatos como Primeiro-Ministro, o mesmo já não se pode dizer do último, em que deixou o país numa situação complicada.
Portugal é um país de memória curta. Hoje é-se adorado e amanhã odiado e o contrário, pelos vistos, também se verifica. Por isso, vou aqui lembrar aos mais esquecidos (pelos vistos a maioria da população portuguesa) os 10 anos de legislatura de Cavaco Silva.

Cavaco Silva saiu do Governo criticado por tudo e todos. Tudo fruto do mau trabalho que efectuou enquanto Primeiro-Ministro, especialmente de 1991 a 1995, em todas as áreas. Para começar, a sua área favorita, a economia, estava a ir de mal a pior. Enquanto que de 1986 a 1990 tinha-se registado um crescimento do PIB de 2,4%, de 1991 a 1995 a economia portuguesa registou valores negativos, com um crescimento de -0,2%. O défice aumentava a olhos vistos, para não falar das condições sociais. A taxa de desemprego, só para terem uma ideia, em 1990 era de 4,7%, em 1995 era de 7,2%! Esta diferença pode não significar muito para os mais leigos, mas acreditem que é bastante. Em 1999 esta taxa havia voltado aos 4,4%. Na área da educação não se encontrava soluções. Tentavam-se introduzir reformas e mais reformas, mas cada qual a pior. Também esta área estava a cair num buraco demasiado fundo. Cai assim por terra os que dizem que ele vai dar um bom Presidente da República porque foi um bom Primeiro-Ministro.

No entanto, vocês podem dizer: "Mas ele agora não vai para o Governo, ele vai ser é Presidente da República". E dizem muito bem. Ele não vai governar. E aí está outro ponto que a maioria das pessoas não percebe. O Presidente da República não governa. E aí está a prova que não serve para nada ter um Presidente da República economista, porque simplesmente ele não vai governar. O Presidente da República promulga ou assina e, consequentemente, pode recusar a promulgação ou assinatura de leis, decretos-leis, decretos regulamentares e restantes decretos do Governo. Mas o mais importante num Presidente da República é o facto de ser, normalmente, a voz da seriedade e imparcialidade na abordagem a qualquer assunto político, e não só. Um Presidente da República precisa de ser bem formado em termos morais e éticos. E, como toda a gente sabe, nesse sentido, Cavaco Silva é o pior candidato.

Se bem se lembram, no seu último mandato, a contestação era muita, e organizavam-se cada vez mais manifestações. Na altura, essas manifestações eram mais parecidas com guerras civis. É verdade. Isto hoje é impensável, mas na altura do Governo do Cavaco as manifestações acabavam sempre com "carinhos" da polícia de choque aos manifestantes. Esta é a faceta mais, digamos, extremista (de direita) do Aníbal. Na altura, as pessoas não tinham direito a manifestarem o seu desagrado com as suas políticas. Ou melhor, ter até tinham, mas depois ele também se sentia no direito de mostrar o seu desagrado com as acções de desagrado da população. Felizmente que hoje isso é, como eu disse anteriormente, impensável acontecer. Mas isto é apenas um exemplo da tão falada liberdade defendida por Cavaco Silva.
As outras razões pelas quais ele não deveria ser Presidente da República é o facto de defender ideias completamente retrógradas, completamente ultrapassadas, nos tempos que correm. Por exemplo, ele é a favor da corrente lei do aborto. Uma lei que, ridiculamente, ainda vigora. No entanto, ele já disse que promulgaria uma proposta de referendo da Assembleia da República. De referendo acredito, mas se saísse da Assembleia uma lei que não proibisse o aborto até às 14 semanas (como deveria ser feito) certamente ele não a promulgaria.

Aí está outra coisa que eu não percebo. Porque raio é que o Governo legisla uma enorme quantidade de leis, muitas delas igualmente importantes, sem referendo, e para isto do aborto é preciso um?? Se alguém me conseguir explicar agradecia. Bem, mas isso são outras histórias.

Bem, isto do aborto é apenas uma das coisas em que Cavaco Silva demonstra o quão retrógrado ele é. Ele é também, entre outras, contra o casamento de homossexuais, contra a legalização de drogas leves, enfim, contra leis que introduzam maior liberdade e melhor qualidade de vida às pessoas.

Então perguntam vocês: "Então qual é o que daria melhor Presidente da República?". Na minha opinião é sem sombra de dúvidas Manuel Alegre, por todas as razões.

Manuel Alegre esteve preso na cadeia São Paulo de Luanda, esteve na guerra colonial, conspirou, e foi por isso expulso das fileiras. O regime salazarista era muito forte na aparência, mas, no íntimo, borrava-se de medo, daí a "polícia política", com seus bufos, seus esbirros, que vigiavam até dentro das pró­prias famílias, à maneira hitleriana... Manuel Alegre lutou contra tudo isto na altura em que a luta podia significar, e significava mesmo, o exílio, a cadeia, o desterro.
Depois do 25 de Abril, dir-se-ia que Manuel Alegre iria repousar, que o País de Abril, que ele próprio profetizou na Praça da Can­ção, lhe daria a paz, o sossego, o pão para todos, a rosa... Não, não deu. E não deu porque a sociedade e a política são conceitos em perpétuo movi­mento, às vezes para a frente, outras para trás, outras ainda em espiral, o que significa que a sede e a fome em vez de serem sacia­das são, ao invés, espicaçadas. Manuel Alegre esteve, em plena Revolução, contra certas tentações totalitárias, quer de um ou do outro lado da panóplia política, nunca se satisfez - um Poeta nunca se satisfaz... A sua poesia, mais amadurecida pela idade e pela expe­riência, reflecte isso mesmo. Nunca cantou o paraíso parado, mas, sim, o paraíso a conquistar ou sempre por conquistar.
Ter um Presidente da República com um perfil destes, é um luxo, diferente da desesperança e dos ideais de outros que fazem da vida uma máquina de calcular, que subtrai em vez de somar, que divide em vez de multiplicar, em que tudo se resume à aridez de um número, de uma percentagem, de uma estatística gelada.

Nenhum presidente vem resolver o problema económico do país. Não haja ilusões quanto a isso. Não é esta a sua função, nem a sua competência. Agora representar a Nação, como a Bandeira, isso sim, já lhe pertence. E ser vigilante atento do cumprimento da Constituição, não só nos aspectos formais, mas sobretudo nos sociais. E quer se concorde, quer se dis­corde, só um representaria o país na sua globalidade e profundeza cultural e histórica que tantos séculos como Nação lhe conferiram: Manuel Alegre.


Aqui tentei expor alguns factos, pelos vistos já esquecidos pela população portuguesa, e a minha opinião pessoal sobre as presidenciais. Só mais uma palavra de repudio para aqueles que defendem o voto apenas nos que têm hipóteses de ganhar. Isso não é democracia. Todos têm hipóteses de ganhar. Basta que votem neles. Votem de acordo com a vossa consciência, mesmo que esse voto, em princípio, não vá decidir nada.

Espero que estes factos que aqui apresentei, assim como, quem sabe, as minhas opiniões, vos ajude a decidir a quem vão dar o vosso importante voto no próximo dia 22.

Passem uma boa semana de reflexão.

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